O SENTIDO DO PRÉMIO UNIVERSIDADE
DE COIMBRA 2021 AO POETA-CARDEAL D. JOSÉ TOLENTINO DE MENDONÇA
Entre o elogio e o alerta - não só
à vetusta Universidade de Coimbra como a outras - o agradecimento de Tolentino
de Mendonça, verdadeira oração de sapiência (sapiência todavia como um
despertador para uma sociedade sonolenta, viciada e viciante), parece rodear-se
de um sentido simbólico que cai com rigor e grande necessidade sobre a cidade
de Coimbra: a urgência de devolver a palavra aos poetas e aos humanistas, algo
que na «cidade dos doutores» tem andado ausente. Todavia, pelo que se ouviu, Tolentino
de Mendonça não tirou de um lado para colocar noutro, isto é, tomou a
totalidade do saber fazendo a apologia de todo o conhecimento, desde ciência e
tecnologia às humanidades e às artes. Todas cumprem a sua mais alta condição: a
de estarem ao serviço do ser humano.
A decisão da escolha do discurso laudatório (e
brilhante que foi) sobre o homenageado, feito pelo Prof Dr. José Nascimento Costa da
Faculdade de Medicina, coube por certo à organização, assunto que dispensa
qualquer interferência externa. Todavia, apresenta-se-nos esse facto como algo
a merecer alguma reflexão. Na verdade o apelo do cardeal-poeta às humanidades
parece estar a “puxar” também pela história insigne da Faculdade de Letras de
Coimbra, por onde passaram notáveis figuras nacionais e internacionais. O facto
de não ter sido nenhum docente dessa faculdade a fazer a respectiva apresentação,
não desmerece o que José Nascimento Costa disse do laureado que, como referi, se
revestiu de muito cativante. Mau teria sido – se foi o caso – ter-se dado
primazia à ciência para louvar um poeta, humanista e prelado.
As palavras de Tolentino de Mendonça
ultrapassam os muros da universidade, vão até aos quatro cantos do mundo, e
sendo que a vida da cidade de Coimbra vai também além da sua universidade, elas
caem com fragor (como dizia Antero) sobre a cidade «mãe e madrasta». O autor de
«Elogio da Sede» e «A Mística do Instante» veio também subtilmente (como um
poeta o pode fazer) insistir para que se devolva a palavra aos filhos da urbe, os
esquecidos da «madrasta», os que têm algo a dizer, os que possam ter atitudes dinâmicas
sobre o bafio e as águas estagnadas que alagam a memória e as ideias para o
futuro. Seria bom que os decisores de Coimbra aprendessem a lição que D. José
Tolentino de Mendonça deu.
Eduardo Aroso
1-3-2021