segunda-feira, 28 de setembro de 2020

A IGREJA ANGLICANA E A IGREJA LUSITANA

 Um dos poucos actos históricos louváveis que eu conheço da história da Inglaterra foi, para o bem e para o mal, o de não se ter sujeitado à Igreja de Roma, ficando assim a olhá-la de outro modo, graças a Henrique VIII. Ao que consta pela submissão (discutível ou não) a Ana Bolena, camareira da Rainha, muito embora este episódio palaciano já viesse depois do nosso de Pedro e Inês, este de contornos mais elevados. Perante a negação do papado em reconhecer a ligação com Ana Bolena, o rei fez o que fez. Seja como for, o acto viria a influenciar poderosamente os destinos da Inglaterra porque a criação da Igreja Anglicana, olhando de soslaio para Roma, deu logo origem a esse extraordinário espírito de nome Francis Bacon que levaria o pensamento do seu país a libertar-se da “via única”, ou seja, da escola aristotélica que durante séculos norteava o Catolicismo. 

 Pascoaes e bem assim outros antecessores remotos falavam numa Igreja Lusitana, uma ecclesia dir-se-ia mais inclusiva que herética, bastaria para tal ver a relação D. Afonso Henriques com as três religiões do Livro, espírito que continua, vindo a sofrer ruptura com D. Manuel e definhando com D. João III. É sabido que a maioria dos monarcas portugueses foram hábeis nas relações com a Santa Sé, firmes em algumas circunstâncias, mas ao estilo brando de “saber dar a volta” cujo episódio maior foi o da criação da Ordem de Cristo por D. Dinis, quando o facto foi acolher os Templários. No final do século XIX e com o estranho apadrinhamento (!) da Igreja Anglicana cria-se oficialmente uma Igreja Lusitana em Portugal. Só se pode compreender este apadrinhamento baseado numa velha Aliança, mas que, no caso, é incompreensível, pelo que também não se vislumbram influências desta Igreja Lusitana no movimento da filosofia portuguesa, a menos que haja uma Igreja Lusitana oculta, à semelhança do que se passa com a Igreja de Pedro e a Igreja de João.

 Assim, a tendência de uma igreja verdadeiramente lusitana ou lusa, mais de emancipação do que de heresia, saiu gorada, mas, tal como o Destino maior se tem que cumprir, desde cedo se firmou o culto do Espírito Santo em Portugal com a Rainha Santa, porque entendemos seja ele a verdadeira Igreja Lusitana, o nosso “anglicanismo” que muito tem influenciado poetas, pensadores, artistas e outros.    

Eduardo Aroso

Equinócio de Outono, 2020 



   

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