SOU ANTI NADA, MAS POR MUITA COISA (IDEAL)
O que importa é «ser sempre por
alguma coisa», como dizia Miguel Torga. Ser anti… começa logo por anular
qualquer hipótese do outro ter razão, ou parte dela. Mesmo em casos explícitos,
como por exemplo, anti pena de morte, o outro terá que justificar por que
defende essa baixa desumanidade pois, no contexto do mundo ocidental
contemporâneo, pouco adiantaria na generalidade. Mas cabe aos que defendem a
vida, fazê-lo não só parcialmente – como tanto se vê – mas de um modo completo.
Defender a vida é tarefa bem árdua, pois para quem, por exemplo, se bate
afanosamente pela defesa de animais de estimação, deve compreender que “irmãos
e primos” desses bichos entram aos milhares diariamente nos matadouros. A
defesa da vida não pode ser apenas na montra do social ou do politicamente
correcto. Se aplicarmos o tema ao ser humano, encontramos variados exemplos do
que muito se condena por maus-tratos, sobretudo a idosos, não levando em conta os
diluídos e lentos maus-tratos que o sistema inflige a tantas dessas pessoas
cujo dinheiro não chega para comprar medicamentos e comida. O Estado de Direito
e os governos têm dois braços bem diferentes: defendem-se situações tidas como
injustas com mais zelo do que acções para as erradicar. Filosoficamente,
qualquer negação pressupõe uma afirmação prévia, definitiva ou não. O percurso
de vida de muitos anti mostra que nunca foram por coisa alguma, ou andaram
sempre a mudar de coisa.
Eduardo Aroso
26-8-2020