A
DISSEMINAÇÃO DO PENSAMENTO BINÁRIO
Esta
insidiosa atitude mental dualista que invade a sociedade e cresce rapidamente
nas televisões e redes sociais, gera de imediato a dificuldade de qualquer
exame minucioso, sobretudo porque não há tempo nem abertura de espírito para
uma terceira via. Nada do que aqui falo se refere ao que nos habituámos, como
únicas verdades, do «não» ou do «sim», nem do próprio «nim» que pode ser – e quantas
vezes - a completa ausência de reflexão. Quando um dia se aprofundar a evolução
do ser humano nos efeitos da linguagem binária da informática ou mesmo da
publicidade a toda a hora sobre o nosso inconsciente, é de prever resultados
impensáveis, pois a estrutura binária do mundo da informática ainda esconde
alguns enigmas a desvendar. A verificação da sua eficácia é fácil e imediata,
mas não os efeitos que, a médio e longo prazo, possa ter no comportamento
humano.
O
reflexo deste padrão de pensamento binário no dia-a-dia observa-se de modo
imediato nos textos e comentários do fb. Descontando a lamentável falta de educação
de muitos utilizadores, a discordância, coisa incómoda para muitos, é, regra
geral, tanto mais incómoda se bem fundamentada. A clarividência do eminente
Byung-Chul Han mostra-o bem na sua obra «A Expulsão do Outro» (ed. Relógio de
Água).
Nos
debates televisivos, de modo dissimulado, há quase sempre uma espécie de falsas
opções, que são apenas variantes do mesmo modelo ou sistema vigente visto na sua
globalidade. Quando alguém ousa isso, é apelidado de extremista, ou outro “ista”
qualquer, sem que, contudo, se negue o “extremismo militante” que sempre
existiu. Toda a matéria que fuja a isto é afastada. Neste nível há outras
atitudes semelhantes, como a de um certo «mainstream» da ciência que, seja qual
for a razão, afasta do seu objecto (interesse) de estudo determinados temas,
apelidando a quem os estuda de “não científico”. O «não há outra alternativa»
continua vivo entre nós, encoberto no véu da hipocrisia sistémica que tem
desterrado para longe os humanistas, artistas, pensadores, aqueles que sabem
(sejam quais forem) e até a força da generosidade de pessoas simples, em favor
de plutocratas, tecnocratas e agora de políticos populistas.
Quando,
globalmente falando, o mundo rock e inúmeras variantes e géneros de música
deste tipo baniram o compasso ternário (assunto ao qual voltarei) da quase
totalidade das composições, obviamente se enredaram no binário e no quaternário
(não deixando este de ser estrutura binária, apesar das acentuações), matéria
esta bem analisada, por exemplo, por David Tame em «O Poder Oculto da Música»
(editora Cultrix). Mas pior do que isso é o compasso unitário, de uma
massacrante acentuação forte sem respiração e que muitos jovens utilizam como
narcótico sonoro.
Eduardo
Aroso ©
17-11-2020