domingo, 28 de fevereiro de 2016

RECOMEÇANDO

O sol nasce, 
a neve pode brilhar,
mas és tu que abres
o dia com a primeira
palavra pronunciada:
o arado quente...

Eduardo Aroso
27-2-2016

sábado, 27 de fevereiro de 2016

METAMORFOSES DO BETÃO
IN COIMBRA CITY

Um dia
Os musgos,
Certas plantas
E algumas estranhas flores de lotes...
Subirão latejantes
Pelas paredes em agonia,
Lamentando o destino
De não serem terra,
Junto ao Parque Verde
Ali onde tudo respira
E a esperança nunca se perde.

Coimbra, 26-2-2016
Eduardo Aroso ©



quinta-feira, 18 de fevereiro de 2016

Miranda do Corvo, 1-2-2016
PAISAGENS (2)

Um a um, os ramos iam caindo como se gente fosse atirada abaixo de uma varanda, sem que houvesse ímpeto de desprezo ou belicismo. Ao som estridente da serra mecânica, amontoavam-se no chão, deixando um alívio no cimo da árvore. Era como o arrumar de uma casa, ou alguém que retirasse ideias caducas da cabeça que já não podiam dar mais nada. Por fim, ficou o tronco grosso, frio e hirto, uma espécie de estátua vegetal à espera que a primavera lhe faça nascer os cabelos e da maquilhagem mais bela: um verde humedecido de seiva. 


Eduardo Aroso

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

HIPERTENSÃO J E HIPERATENÇÃO

Um criador artístico é um hipertenso, quer os indicadores apareçam, ou não, no respectivo aparelho de medição. Tudo nele está acima do normal e, com a idade, isto é, a prática e o ânimo de «dar à luz», pode mesmo aumentar de intensidade. O par da hipertensão é uma intuitiva hiperatenção mesclada de sentimento estético que acaba por definir o perfil de artista hipertenso que talvez melhor se defina como um hiperacordado!
Há dias, alguém me dizia que vinha do médico cardiologista, relatando-me o sucedido. Para remate de conversa disse-lhe: - Pois tome lá (se for caso disso) o comprimidinho necessário, mas não deixe de criar, de continuar a sua obra, mesmo que os outros ainda não a reconheçam como deve ser. Continue, pois se deixa de o fazer, então é que as suas veias lhe rebentam de vez, e aí é o cabo dos trabalhos… O homem riu-se, acrescentando que era mesmo o fim do trabalhos… Ainda me disse: - Antes que as veias rebentassem morria-me a alma antes do corpo!

Eduardo Aroso
11-2-2016


sábado, 6 de fevereiro de 2016

O CARNAVAL, A IDENTIFICAÇÃO DA CARNE E UM JÚBILO RADICAL

Oh, se esta alegria fosse a que diariamente nos falta, a que se busca em vão quantas vezes por caminhos infrutíferos, o júbilo perdido do simplesmente existir como ser, matéria-prima humana fosse ela, anterior aos vislumbres do ADN. Lembrança de um génesis que um vento aleatório, mas possível, ainda pode trazer.
 Quem dera este provocado e intenso lance - que vem e desaparece como o suor de algumas horas – fosse folia de saber confiança no destino e na vida, como o nascer matutino do sol e o parto anual da natureza na diversidade de crias que nos chegam de vários modos e para tantos suprimentos.
 Actos de pura motricidade, provocados, anémicos e transgénicos, fossem eles a Folia do Espírito Santo, a da abundância sem desperdício, que faz acontecer a mensagem sem intermédios, e que fará cada qual ser, ao mesmo tempo e em cada dia, o juiz e o julgado. Se invocar a alegria, sem o seu cultivo, não é um ofício negro, fá-lo aparecer como cinzento, ao jeito do abuso do sagrado dom da comunicação, pela, pior que vacuidade da palavra, a sua perversão no ávido altar do entendimento humano. Por desnecessário, nenhum seguro de vida pode garantir o autêntico desfile da vida.

Eduardo Aroso ©
6-2-2016


quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

CURIOSIDADES NATURAIS E LEGÍTIMAS DAS CRIANÇAS
(A CRIAÇÃO DE AVES)

- Mamã, só vejo o nosso papagaio aqui na gaiola!
Onde existem os bandos de papagaios?
- Nas televisões, filho! É onde podes ver mais. E de várias cores…
- Então, sendo eles de várias cores, palram de modo diferente?
- Nem tanto. O piu piu deles vai dar sempre ao mesmo. A isso chama-se, em filosofia, o óbvio,    ou algo parecido. Os papagaios têm todos uma característica igual, e é por isso que lá permanecem: palram sempre o que nós gostamos de ouvir.
- Mamã, como se reproduzem esses papagaios?!
- Nem queiras saber, filho. É muito mais complicado do que aquilo que se passa no capoeiro das galinhas da tua avó!...

Eduardo Aroso
4-2-2016


segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016

ENSINANDO ASTRONOMIA (E METALURGIA) ÀS CRIANÇAS

- Mamã, os tachos têm pernas?
- Que pergunta! Claro que não!
- Mas eles mudam de sítio…
- Sim, movimentam-se…alguém os muda.
- Quando é que os tachos estão quietos e acabam as trocas e baldrocas?
- Olha, filho, quando acabar o metal de que são feitos e que há nos ministérios. Mas olha que o movimento dos tachos é como o do Sol à volta da terra: é aparente. Isto é, assim como o Sol é que está parado e a Terra gira em volta, também os tachos são sempre os mesmos; as pessoas é que vão girando à volta deles.

(O filho fechou o livro, dizendo que já tinha entendido o princípio basilar da astrometalurgia).

Eduardo Aroso 1-2-2016