terça-feira, 17 de novembro de 2020

A DISSEMINAÇÃO DO PENSAMENTO BINÁRIO

 Esta insidiosa atitude mental dualista que invade a sociedade e cresce rapidamente nas televisões e redes sociais, gera de imediato a dificuldade de qualquer exame minucioso, sobretudo porque não há tempo nem abertura de espírito para uma terceira via. Nada do que aqui falo se refere ao que nos habituámos, como únicas verdades, do «não» ou do «sim», nem do próprio «nim» que pode ser – e quantas vezes - a completa ausência de reflexão. Quando um dia se aprofundar a evolução do ser humano nos efeitos da linguagem binária da informática ou mesmo da publicidade a toda a hora sobre o nosso inconsciente, é de prever resultados impensáveis, pois a estrutura binária do mundo da informática ainda esconde alguns enigmas a desvendar. A verificação da sua eficácia é fácil e imediata, mas não os efeitos que, a médio e longo prazo, possa ter no comportamento humano.

O reflexo deste padrão de pensamento binário no dia-a-dia observa-se de modo imediato nos textos e comentários do fb. Descontando a lamentável falta de educação de muitos utilizadores, a discordância, coisa incómoda para muitos, é, regra geral, tanto mais incómoda se bem fundamentada. A clarividência do eminente Byung-Chul Han mostra-o bem na sua obra «A Expulsão do Outro» (ed. Relógio de Água).

Nos debates televisivos, de modo dissimulado, há quase sempre uma espécie de falsas opções, que são apenas variantes do mesmo modelo ou sistema vigente visto na sua globalidade. Quando alguém ousa isso, é apelidado de extremista, ou outro “ista” qualquer, sem que, contudo, se negue o “extremismo militante” que sempre existiu. Toda a matéria que fuja a isto é afastada. Neste nível há outras atitudes semelhantes, como a de um certo «mainstream» da ciência que, seja qual for a razão, afasta do seu objecto (interesse) de estudo determinados temas, apelidando a quem os estuda de “não científico”. O «não há outra alternativa» continua vivo entre nós, encoberto no véu da hipocrisia sistémica que tem desterrado para longe os humanistas, artistas, pensadores, aqueles que sabem (sejam quais forem) e até a força da generosidade de pessoas simples, em favor de plutocratas, tecnocratas e agora de políticos populistas.

Quando, globalmente falando, o mundo rock e inúmeras variantes e géneros de música deste tipo baniram o compasso ternário (assunto ao qual voltarei) da quase totalidade das composições, obviamente se enredaram no binário e no quaternário (não deixando este de ser estrutura binária, apesar das acentuações), matéria esta bem analisada, por exemplo, por David Tame em «O Poder Oculto da Música» (editora Cultrix). Mas pior do que isso é o compasso unitário, de uma massacrante acentuação forte sem respiração e que muitos jovens utilizam como narcótico sonoro.

 

Eduardo Aroso ©

17-11-2020

 

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