sexta-feira, 18 de agosto de 2017

DO COMPLEXO FENÓMENO DO FANATISMO – DO ORIENTE AO OCIDENTE

Radicalismo, fundamentalismo e fanatismo, podendo tocar-se, inscrevem-se em realidades com géneses diferentes, mas não constitui propósito destas palavras esmiuçar a questão, mas sim uma outra. Quanto ao título, o que de imediato nos poderá saltar à mente é se o fanatismo é apenas uma realidade que se gera no seio de certas sociedades a oriente, amiúde sob um rótulo religioso, geralmente islâmico, ou se também no ocidente a mesma compulsão ou grau emocional imbuído de questões doutrinárias, políticas e de outra natureza, também existe, embora de outra maneira. Não pode haver esquecimento para o fanatismo ocidental hitleriano que pretendia exterminar os impuros de raça. O mesmo perigo ronda hoje um presidente que por certo, não em nome de Alá mas em nome de um egoísmo pessoal ou de interesses outros, pode disparar um míssil.
Se existe esta má sementeira também a ocidente, ela é uma realidade que não pode ser iludida. É hábito dizermos que há pessoas boas e pessoas más em todo o lado. Os fanáticos podem existir em qualquer ponto do globo, certamente não sobrevivendo da mesmo maneira, porque como bem observou Edgar Morin (e cunhou o conceito) as sociedades ditas evoluídas tornaram-se «complexas», termo que, em meu entender, se deve também, ler «completas». Está claro que, se assim é, os modos como pode existir o fanatismo para os lados onde o sol se põe, é bem diferente do seu congénere a oriente, e as máscaras que toma no ocidente fazem-no logo menos perigoso, pois, quando muito, tido como ideologia ou princípios, agredindo de uma maneira mais amortecida e até adocicada…
É um facto que o chamado «Estado de Direito» e o próprio diálogo democrático, com todas as imperfeições que possa ter em alguns países, vai estabelecendo a grande diferença entre fanatismo e convicção. Do ser tribal à individuação, como Carl Jung a viu, vai uma grande distância. E é indiscutível que à Europa a partir do Renascimento se deve a consciência mais nítida do que é a individualidade, porque individualismo é sempre a baba que cai sempre de qualquer boca mais egoísta. 
O fanatismo tem-se conotado com o fenómeno religioso ainda que possa estar imbuído de alguma interferência sociopolítica, mas a mesma compulsão pode existir especificamente na política, com ou sem o nome de ideologia todavia em intransigente defesa partidária. Assim a militância, embora mais branda, é susceptível de assumir uma atitude fanática. Até na arte, que não obedecendo a normas rígidas (muito embora exista sempre um «espírito de época» e com a liberdade que acompanha o instinto criador) se pode encontrar algum fanatismo quando nega toda a estética anterior para criar uma outra de raiz. E não é menor fanatismo o que – e cada vez mais – é praticado por adeptos de futebol que não atirando nenhum carro para a multidão, podem, contudo atirar umas tochas a arder para a bancada dos adeptos da equipa adversária. Esquece-se bastante que muito embora tenha havido ao longo da História épocas de rupturas, o certo é que como dizia um velho agricultor da minha aldeia «o mundo é feito às camadas, como uma cebola».
Já foi dito há bastante tempo que muito mais difícil do que encontrar um ser verdadeiramente genial seria encontrar um ser equilibrado. E na diferença se pode ver a maior ou menor permeabilidade a essa incontrolada compulsão humana que tantos estragos faz. 
De actos mais antigos como os “zelosos” da pureza doutrinal” mas que queimavam imediatamente os que lhes pareciam fora desse estado de graça; dos que são adeptos das touradas com reprováveis agressões aos animais, aos que, ainda ao jeito mais severo da lei mosaica, quase chicoteariam, se pudessem, os que se manifestam a favor da arena, vai ainda um caminho de compreensão que obviamente tem que assentar numa pedagogia de ética da vida. Ou dos que reprovam a utilização das lãs para não molestar os animais, esquecendo-se que é um bem para o próprio animal a mansa tosquia. 
O que é estranho é que no Ocidente muitas situações de fanatismo são paradoxais, isto é, onde não era suposto haver tal desequilíbrio ele existe. Mas na génese do fanatismo parece estar a raiz de todos os males: o poder, isto é, a ânsia desesperada e errada de ter poder.

Eduardo Aroso 
18-08-2017

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