sexta-feira, 14 de abril de 2017

PÁSCOA E NATUREZA 

O êxodo nestes dias de Páscoa em busca de praias ou de itinerários serranos faz-nos pensar nas raízes portuguesas do nosso peculiar paganismo. Todavia, se por um lado é um acto natural, de outro modo este ímpeto actual repousa também numa crescente atitude turística dessacralizada. Não é de todo inviável a vivência pascal no abraçar a Natureza que nos desponta e brinda, isto é, fazer dela também um altar. Não parece ser todavia esta debandada de gente, assustada com o sagrado, a busca de um Paganismo superior como queria Fernando Pessoa. O impulso é mais um sintoma que contém algo de incrustado desespero de quem já fez uma cisão com a Natureza: pelo lado de dentro, com equivocado entendimento do lado de fora.
 O penúltimo capítulo da «História Secreta de Portugal» de António Telmo mostra o cenário que se nos oferece ver. Quem se senta numa esplanada à beira-mar parece não suportar já a sonoridade das ondas, as frases melódicas das gaivotas, em suma, a voz do mar entrelaçada com o vento, coisa agora de metereologia ou algo que pode trazer algum prejuízo aqui ou acolá numa plantação, se sopra mais forte. A música, de batida insistente e em subido volume, abafando mesmo as conversas, diz que o dono daquele espaço comercial, se assim não procedesse, a esplanada teria pouca ou nenhuma gente. O dito “stress” – ou uma estranha relação com a Natureza – não se desagarra das pessoas nesta via-sacra pagã. O espanto, face ao silêncio ou ao som da terra e do mar, deu lugar ao medo do silêncio.

Eduardo Aroso

(Páscoa de 2017)  

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