terça-feira, 2 de março de 2021

O SENTIDO DO PRÉMIO UNIVERSIDADE DE COIMBRA 2021 AO POETA-CARDEAL D. JOSÉ TOLENTINO DE MENDONÇA

Entre o elogio e o alerta - não só à vetusta Universidade de Coimbra como a outras - o agradecimento de Tolentino de Mendonça, verdadeira oração de sapiência (sapiência todavia como um despertador para uma sociedade sonolenta, viciada e viciante), parece rodear-se de um sentido simbólico que cai com rigor e grande necessidade sobre a cidade de Coimbra: a urgência de devolver a palavra aos poetas e aos humanistas, algo que na «cidade dos doutores» tem andado ausente. Todavia, pelo que se ouviu, Tolentino de Mendonça não tirou de um lado para colocar noutro, isto é, tomou a totalidade do saber fazendo a apologia de todo o conhecimento, desde ciência e tecnologia às humanidades e às artes. Todas cumprem a sua mais alta condição: a de estarem ao serviço do ser humano.

 A decisão da escolha do discurso laudatório (e brilhante que foi) sobre o homenageado, feito pelo Prof Dr. José Nascimento Costa da Faculdade de Medicina, coube por certo à organização, assunto que dispensa qualquer interferência externa. Todavia, apresenta-se-nos esse facto como algo a merecer alguma reflexão. Na verdade o apelo do cardeal-poeta às humanidades parece estar a “puxar” também pela história insigne da Faculdade de Letras de Coimbra, por onde passaram notáveis figuras nacionais e internacionais. O facto de não ter sido nenhum docente dessa faculdade a fazer a respectiva apresentação, não desmerece o que José Nascimento Costa disse do laureado que, como referi, se revestiu de muito cativante. Mau teria sido – se foi o caso – ter-se dado primazia à ciência para louvar um poeta, humanista e prelado.

As palavras de Tolentino de Mendonça ultrapassam os muros da universidade, vão até aos quatro cantos do mundo, e sendo que a vida da cidade de Coimbra vai também além da sua universidade, elas caem com fragor (como dizia Antero) sobre a cidade «mãe e madrasta». O autor de «Elogio da Sede» e «A Mística do Instante» veio também subtilmente (como um poeta o pode fazer) insistir para que se devolva a palavra aos filhos da urbe, os esquecidos da «madrasta», os que têm algo a dizer, os que possam ter atitudes dinâmicas sobre o bafio e as águas estagnadas que alagam a memória e as ideias para o futuro. Seria bom que os decisores de Coimbra aprendessem a lição que D. José Tolentino de Mendonça deu.

Eduardo Aroso

1-3-2021

 

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