DO NOSSO TIMBRE
As vogais são a flor da
Língua. As consoantes são o apoio lançando o som puro (vogais) e sustentando-o,
do mesmo modo que o jogador de ténis-de-mesa impele a raquete que batendo na
bola a projecta no espaço. A perfeição vocálica, qual harmonia da música,
depende muito de um espaço de ressonância. Observamos que o palato humano tem
uma configuração idêntica a uma abóbada de um templo, e no seu microcósmico
funcionamento ensinam os professores de Canto que a utilização do palato é uma
técnica fulcral.
Considerando geograficamente o assunto da ressonância podemos
observar (escutar) o fenómeno, por exemplo, num desfiladeiro, ou entre terra
mar, quando o som das ondas encontra espaços vários e aí ressoa, combinando-se
também com outros sons da terra, sendo certo que espaços amplos tendem a
prolongar o som.
Este, pela natureza dos objectos com os quais se cruza (e é
claro também pela natureza do emissor) produz o timbre, um dos elementos
essenciais da música, e que depende essencialmente da natureza dos materiais e
do modo de obter o som. Ora, tal como as ondas ao longo da costa, em vários
contornos, também as vogais emitem-se, prolongam-se, fluem e refluem,
eventualmente mudando em subtis nuances o seu timbre. Assim tem sido ao longo
de séculos, à imagem das “ondulações” do canto gregoriano nos claustros e
abóbadas dos templos.
Agora uma pergunta: o
leitor já imaginou o que seria se todo o som produzido ao longo da nossa orla
costeira de repente deixasse de se ouvir? Certamente notaríamos uma estranha
sensação – fenómeno nunca sentido – da ausência do nosso som, do nosso timbre natural, realidade a que não damos
atenção consciente no dia-a-dia, do mesmo modo que não sentimos directamente no
equilíbrio do corpo os ininterruptos movimentos de rotação e de translação da
Terra na sua divina marcha.
Eduardo Aroso,
2013
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