A TRADIÇÃO PORTUGUESA TEM RAZÃO SOBRE O
SENTIDO FUTURISTA DA CRIANÇA
«O homem e a hora são um só» Fernando Pessoa
«The childhood shows the man, as morning shows the day» John Milton
As últimas notícias sobre o equilíbrio
climático colocam-nos em presença de uma situação mundial, tão emergente como
invulgar, tendo como protagonista uma adolescente que não constitui uma mera história
de bairro ou de notícia fugaz, mais ou menos predadora da fragilidade da
criança, e que daqui a pouco tempo possa ser esquecida, mas daquilo que Fernando
Pessoa caracteriza com uma certeza fulminante: «O Homem [leia-se, obviamente, o
ser humano] e a hora são um só». E sejam quais forem as condicionantes e a
panóplia de interesses que possam rodear Greta Thunberg, atingiu-se o «ponto
sem-retorno». Tendo ou não controlo emocional na radicalização das suas palavras
(diz-se que tem síndrome de Asperger e não só), o certo é que bastaria pensar na
capacidade de mobilização dos jovens à escala mundial, algo que nenhum político
ou cientista pode fazer.
William Wordsworth (1770 – 1850) disse:
«The Child is father of the Man», parecendo até ser
pai de mudanças políticas necessárias. Antes, John Milton (1608 – 1674) tinha escrito: «The childhood shows the man, as morning shows the day». António Quadros, em «Portugal
Razão e Mistério», discorrendo sobre a cerimónia do Bodo e da Coroação nas
Festas do Espírito Santo (no reinado de Dinis e Isabel), citando Manuel Breda
Simões, diz que a tradição tomou a criança para a chamada Tripla Coroação
(ritual que singularmente ainda hoje se realiza no Penedo-Sintra), pelo que a
criança «assumiria o papel de mediador… presença do ciclo do perpétuo
rejuvenescimento…o Menino-Imperador, expressão da infância presente, faz-se
acompanhar da infância passada e da infância futura», o que uma quadra anónima
não desmente: «Uma criança se ergue/com critérios de justiça./ Acordai, homens,
acordai/ p’ra esta nova milícia».
Desde que o ser humano, pelo aperfeiçoamento
tecnológico foi sendo capaz de aumentar a sua eficácia de ganhar dinheiro com
mais rapidez, explorando a Natureza (e outros seres humanos), como se ela fosse
um ser morto, caiu no atoleiro do materialismo onde agora se encontra.
Portanto, a vontade política, mesmo que consensual no que toca a fazer leis na
defesa do planeta, não basta, porque o cerne do problema é mais complicado e,
diga-se, é mesmo de ordem filosófica e ética, na base da economicista. Problema
que podendo atenuar-se um pouco, com decretos e alterações nas constituições,
não resolve o que já está bastante enquistado e acumulado. Ouso afirmar que o
sentido simbólico que existe em Greta Thunberg, - tenha ela cara de zangada ou
não, seja ou não motivo de interesses - é a ultima esperança da humanidade, na
questão ambiental. Se assim não for, o mundo está perdido, porque nos adultos
já ninguém acredita.
Eduardo Aroso
24-9-2019
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