DA ESFÍNGICA INTERROGAÇÃO
ATLÂNTICA
«Fita, com olhar esfíngico e fatal,
O Ocidente, futuro do passado»
O Ocidente, futuro do passado»
Mensagem, F.
Pessoa
Por que é que o nosso olhar
desafia a Esfinge? Se esta, nos confins do deserto do Saara, olha persistente e
inamovível o oriente, Portugal fita o lugar onde o sol se põe, tão bem lembrado
por Unamuno e por Pessoa. Fitar o
ocidente, que é como quem está perante o fruto maduro de mais um dia, ou de um grande
ciclo histórico, o que, pela analogia, adensa
o mistério, pois em matéria de simbologia pode levar-nos a outras visões.
Se a Esfinge formula o enigma
da vida e da morte, o que é consequência do Portugal das Descobertas, o lusismo
ou lusofonia que «falta cumprir», interrogando o ocidente, pode muito bem
desafiar a síntese de muito do que tem sido a História. Se Portugal não pode
representar o que é de outras nações, fez-se por sua natureza liame para ainda
celebrar o bodo da mesa fraternal, comunhão universal que clama por ser.
Nessa síntese, que é como diz
encerramento de ciclo, abre – paradoxalmente no vazio – o espaço do novo, seja
já «a madrugada irreal do Quinto Império», seja, noutro nome, «A Nova Terra e os Novos Céus». A esfinge que, na nossa
imaginação, se senta no ponto mais ocidental, o cabo da Roca, olhando o
Cruzeiro do Sul, se no arquétipo universal é a mesma do Egipto, no Plano da
Manifestação pode ser a esfinge atlântica que, ao invés, de interrogar
viajantes e marinheiros sobre o enigma da vida e da morte, o faça sobre o sopro
que atravessa a Esperança. Se o oriente é já o sol nascente, imagem do
acontecer, o lugar onde desce o astro-rei é o da Esperança do regresso, não de
modo sebástico e incerto, mas já na certeza intocável do Amor criador diário.
«Verei o Criador nas criaturas», como sentiu e escreveu Frei Agostinho da Cruz,
parece ser o repto lançado a quem, por água ou pelo ar, cruza o oceano, numa
atitude que ultrapassa o imediatismo de Deus ser brasileiro ou macaense (!). A
esfinge atlântica talvez peça a senha da palavra poética como graça para a
fraternidade das criaturas.
Eduardo Aroso,
Lua Cheia de
Setembro, 2016
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